Sempre pronto para o combate

Sempre pronto para o combate

Eder Batista, de 38 anos, superou todas as dificuldades do Crohn e, hoje, o esporte e a doença formam uma dupla que se cuidam mutuamente

Sou de uma família de cinco irmãos e minha infância foi sensacional. Com 16 anos comecei a namorar e, neste mesmo ano, aconteceu a primeira tristeza na minha vida: perdi meu pai. Minha mãe, sempre guerreira, trabalhou e educou toda a família. Sempre fui muito bem de saúde, genética boa e corpo legal. Quando completei 18 anos, comprei uma moto. Queria namorar e curtir com os amigos ao mesmo tempo, e isso gerava muitos desentendimentos com minha namorada. E foi durante essas brigas que passei a sentir fortes dores na barriga. Depois de algum tempo decidimos acabar com o namoro de nove anos e passei a ter uma vida mais livre com a companhia de bebidas, churrasco e cigarro.

Comecei a ter algumas diarreias, mas pensava que fossem em decorrência da minha vida desregrada, pois não tinha horário para me alimentar e não dormia direito. Eu procurava o posto de saúde, fazia exames e nunca aparecia nada de anormal. Mas começaram os vômitos e fui perdendo peso muito rápido. No começo, pensei que fosse estresse devido ao término do relacionamento e pelo fato de ter ficado desempregado. Algum tempo depois comecei a ter desmaios repentinos. Procurei um laboratório e fiz todos os exames, inclusive HIV, mas só apareceu uma anemia.

Comecei a fazer exercícios, corria na Lagoa da Pampulha, em Belo Horizonte, me alimentava bem e voltei ao peso normal, mas a diarreia e a falta de controle de segurar a evacuação persistiam. Algumas vezes, saía para correr ou para ir a festas e voltava sujo para casa. Tristeza e vergonha! Era 2010, o ano do nascimento da minha filha Camille Fernanda. Estava trabalhando e bem fisicamente, mas a dor na barriga permanecia. Até que começaram as diarreias diárias, as idas ao banheiro várias vezes ao dia e a presença de sangue nas fezes. Em 2011, descobri o motivo de todos aqueles sintomas: eu tinha doença de Crohn, diagnóstico que só recebi depois do primeiro procedimento cirúrgico.

Foram dias de muito sofrimento e tive de usar morfina para controlar a dor. Fiz nova cirurgia e retiraram um pedaço inflamado do meu intestino. Tive problemas de circulação, fizeram traqueostomia, induziram coma e resisti a quatro paradas cardíacas. Fiquei 19 dias na UTI, tive necrose dos dedos do pé até a panturrilha e, em janeiro de 2012, passei pela amputação de oito dedos dos pés. Vivi momentos de negação, não queria aceitar a minha condição, mas a médica me disse umas verdades e decidi encarar o desafio. Em dezembro daquele mesmo ano, participei da Volta Internacional da Pampulha, uma tradicional corrida de 18km na capital mineira.

Minha relação com o esporte começou bem antes do diagnóstico e quando dei entrada no hospital para fazer a cirurgia estava muito bem fisicamente, por isso, tenho certeza de que a atividade me ajudou muito durante todo o processo. Hoje, faço da doença e do esporte uma dupla em que um cuida do outro, porque entendi que, com o corpo saudável, minha doença fica controlada. Durante toda essa trajetória, minha maior dificuldade foi conviver em sociedade, pelo fato de a doença ser pouco conhecida. E, embora a adaptação da ostomia não tenha sido fácil no início, hoje entendo que a bolsa ‘salva vidas’.

Participar da exposição Cicatrizes do Invisí­vel, promovida pela ALEMDII, foi uma experiên­cia­ tremenda e me arrependo de não ter mostrado minhas cicatrizes e contado minha história antes. Sei que não é fácil descobrir uma DII e passar por todas as dificuldades, mas creio que Deus não nos dá um fardo que não possamos carregar. Embora seja uma doença crônica, existe tratamento. Por isso, sugiro não esconder o diagnóstico – pois ninguém vive sozinho –, tratar a doença como uma companheira e viver intensamente. O melhor da vida é olhar para trás e ver que conseguimos superar vários obstáculos, além de saber que sempre estaremos prontos para o combate.

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John Doe

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